Reflexões de Dom Orani João Tempesta, arcebispo do Rio de
Janeiro
Estamos em
mais um dos meses temáticos. Além dos temas dos textos bíblicos e os próprios
da liturgia, a Igreja no Brasil nos sugere um assunto que perpassa todo o mês
para a nossa reflexão.
Em setembro, a
Igreja Católica celebra o mês da Bíblia. Esse mês temático foi criado em 1971 e
ele foi escolhido porque no último domingo celebramos o Dia Nacional da Bíblia,
devido à proximidade da festa de São Jerônimo, patrono dos estudos Bíblicos, no
dia 30.
A cada ano um
livro bíblico é aprofundado em nossas comunidades, seja pelas reuniões de
grupos, seja pelas publicações, ou ainda pelas celebrações. Nesse ano, o tema
deste mês é “discípulos missionários a partir do Evangelho de Marcos”. A
escolha desse evangelista ocorre devido ao ano “B” da liturgia dominical, que
contempla a leitura desse texto. Já está previsto para os próximos anos seguir
o mesmo tema à luz do evangelho do domingo: Lucas, Mateus e depois, em 2015,
João.
Graças aos
apóstolos, mais próximas testemunhas que viveram com Jesus Cristo, chegam até
nós a Boa-Notícia da Salvação proclamada pelo Filho de Deus. Assim se expressa
São Pedro: "Senhor, para quem iremos nós? Só Tu tens palavras de vida
eterna?" (Jo 6, 68).
Fé na Palavra,
que é viva! O Verbo é o próprio Cristo: Ele é a Palavra viva! A Bíblia, ou
Sagrada Escritura, é como uma carta enviada, que hoje atualizamos com a prática
da fé, à luz da Tradição da Igreja e do Magistério Pontifício. É a Sua Palavra
viva e eficaz.
O que a
Palavra de Deus me diz, ainda hoje, aqui e agora? Deus fala, ainda hoje, e as
palavras são dirigidas a todas as pessoas. Este é o grande mistério da Palavra
de Deus. Para cada um dirige pessoalmente a sua voz.
Essa verdade
tem consequências enormes. Você precisa ter consciência do que Deus diz na
Palavra, a fim de não perder esses momentos especiais. É então que se faz
necessário perguntar: O que Deus diz para mim, hoje?
Fé na Palavra,
que dá a vida! A Palavra que é dirigida a mim, pessoalmente, é a fonte da
verdadeira vida. A Palavra deve ser assumida com uma fé profunda, que é sempre
dirigida a mim – aqui e agora!!
Encontro com a Palavra viva: sobre o tema, a
verdadeira escola de escuta e oração, o Papa João Paulo II, em sua Carta para o
terceiro milénio, Novo millennio ineunte, nos lembra este verdadeiro programa
de pastoral. Ele escreve: "É necessário que a escuta da Palavra de Deus
deve tornar-se uma vida de acordo com a tradição antiga e sempre válida da
lectio divina, para ajudar a encontrar o texto bíblico como Palavra viva que
interpela, orienta e plasma a existência". Este foi o método escolhido
para ser seguido pelos nossos círculos bíblicos. É também o capítulo IV de nosso 11º Plano de
Pastoral de Conjunto: “A Palavra de Deus: lugar Privilegiado para o Encontro
com Jesus Cristo”.
A Palavra é
uma palavra constantemente presente. Jesus envia seus discípulos a todo o
mundo, ordena-lhes fazer discípulos entre as nações por onde passaram, a pregar
a Palavra exatamente como foi comunicada a eles.
Ler a Bíblia
supõe abertura a ação do Espírito Santo, mas também aprofundamentos. São
importantes alguns estudos preliminares que fornecem uma visão geral das
informações básicas sobre o ambiente em que o livro foi escrito. Por isso, é
preciso conhecer o contexto mais amplo da Bíblia. Este contexto irá variar
dependendo de qual livro queremos ler.
Por exemplo: é
óbvio que devemos ler os Evangelhos com uma ótica diferente como lemos o livro
do Apocalipse. Esta preparação é ainda mais necessária no caso do Antigo
Testamento, que contém uma série de textos escritos dentro de uma cultura muito
antiga. Novas traduções são fornecidas e somos ajudados com os comentários de
rodapé ou à margem do texto. Recorrer aos Dicionários Bíblicos também nos
complementa a ter uma visão mais ampla dos temas e situações. Estes materiais
nos ajudam para a leitura individual. Nesse aspecto, vale a pena mencionar dois
princípios básicos de leitura da Bíblia. Na sua base, há uma regra geral que
diz que toda a Bíblia é um farol para os seres humanos. Assim, o primeiro e
fundamental princípio para se ler a Bíblia é este: cada declaração das
Escrituras considera o contexto em que ela ocorre.
A segunda
regra aplica-se a ter em conta os diferentes tipos de passagens literárias da
Bíblia. Quem já teve até mesmo um contato superficial com várias obras
literárias sabe que o caminho para ler e interpretar tais documentos, ou prosa
(como o romance) e poesia é uma forma diferente. Os autores bíblicos também se
beneficiaram de uma grande variedade de gêneros literários. Na Bíblia,
encontramos textos poéticos (por exemplo, Salmos); encontramos fragmentos de
documentos oficiais (por exemplo, no livro de Esdras, Macabeus); encontramos
fragmentos de narrativa (por exemplo, em Atos dos Apóstolos). Cada leitura é um
pouco diferente. E é necessário evitar o maior perigo na leitura da Bíblia, que
é a interpretação fundamentalista. Esta interpretação é de significado literal
de cada uma das frases das Escrituras, sem levar em conta as implicações
históricas da criação do texto. A leitura fundamentalista da Bíblia enfatiza a
interpretação literal. Necessitamos descobrir o que está na narrativa bíblica e
que é o mais importante, a saber – a mensagem de levar o homem para a salvação.
O nosso dia
deveria começar com a leitura da Palavra. A tradição da Igreja nos coloca os
salmos para a oração da Liturgia das Horas. É, pois, importante que o inciemos
com a leitura orante da Palavra de Deus, algo que vai proteger o nosso coração
durante o dia, como Maria, que mantinha tudo no seu coração. Armanazenar a
Palavra logo de manhã para irmos “ruminando” durante todo o dia. No final do
mergulho na meditação, iniciamos um novo dia com todos os problemas que ele
traz, mas no coração temos uma palavra, ou pelo menos um de seus versos, algo
recebido e acolhido a partir da leitura.
Na liturgia da
missa os vários textos se complementam e na sequência nos ajudam a mergulhar
ainda mais no mistério.
Que no mês da
Bíblia, em nossas vidas, em nossas famílias, em nossas comunidades e
principalmente na animação do nosso círculo bíblico possamos cada vez mais
colocar a Palavra de Deus como centro de nossa ação evangelizadora.
† Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do
Rio de Janeiro, RJ
RIO DE JANEIRO, sexta-feira, 31 de agosto de 2012
(ZENIT.org)
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